RESUMO INTRODUÇÃO
A produção da aquicultura no Brasil tem crescido nos últimos anos, tanto por aumento da demanda pelo pescado, quanto pelo potencial do país para esta atividade econômica. Neste contexto, a Tilápia do Nilo é a espécie mais cultivada da aquicultura continental brasileira (47% da produção total em 2011).
Em condições de cultivo, há vários fatores que causam a perda do status sanitário dos planteis: altas densidades, perda da qualidade da água, baixa qualidade dos insumos e práticas de manejo inadequadas. Este quadro leva à instalação de doenças nos peixes comerciais, e na tentativa de controlar e minimizar enfermidades, os produtores utilizam diversos medicamentos (sobretudo antibióticos) na maioria das vezes de forma indiscriminada, sem considerar concentrações, frequências de uso e tempo de carência para o consumo dos peixes tratados com tais substâncias.
Na esteira da conscientização sobre a sustentabilidade do processo produtivo, há atualmente, a preocupação com o acúmulo de resíduos no ambiente e no produto final destinado ao consumo. Assim, surge a necessidade do desenvolvimento de alternativas terapêuticas ao uso de insumos químicos na aquicultura, e o uso dos medicamentos homeopáticos desponta como terapêutica promissora devido às suas próprias características: fácil administração, dispensando contenção física e o estresse por esta causado; não produzem resíduos, sendo seguros para o ambiente e para o consumo; e possuem baixo custo, gerando menores encargos para a sanidade dos planteis comerciais. Assim, são necessários estudos sobre os efeitos dos medicamentos homeopáticos sobre parâmetros fisiológicos destes animais, visando o estabelecimento de protocolos homeopáticos de profilaxia e tratamento.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar a ação dos medicamentos Sulphur 6CH e Calcarea carbonica 6CH sobre os parâmetros hematológicos e bioquímicos de Tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) variedade GIFT, cultivada em ambiente de laboratório.
MATERIAL / MÉTODO
O estudo foi realizado no Laboratório de Aquicultura da Faculdade de Veterinária da Universidade Federal Fluminense. Utilizados 102 exemplares de Tilápia nilótica GIFT, divididos em dois experimentos, cada um com 3 grupos (Sulphur 6CH (S), Calcarea carbonica 6CH (C) e controle (CT)). Os animais foram cultivados desde alevinos até a fase adulta (9 meses no primeiro experimento, 6 meses no segundo).
Os animais foram alojados em aquários de vidro de 200 L no primeiro experimento, transferidos para aquários de 600L a partir do 6° mês. O segundo experimento foi totalmente conduzido nos aquários de 600L. A mudança no primeiro experimento ocorreu pela necessidade de maior espaço para os peixes em crescimento.
Os medicamentos foram fornecidos em forma de pó de lactose adicionado à ração, semanalmente para alevinos e juvenis, quinzenalmente para adultos.
As análises hematológicas foram feitas no último mês de cada experimento. A colheita de sangue foi realizada por punção dos vasos caudais, com os animais sedados (imersão em óleo de cravo 5%). Parte da amostra foi acondicionada em tubo pediátrico para hemograma contendo EDTA, e o restante dispensado em tubo sem anticoagulante. Os esfregaços sanguíneos foram confeccionados sem anticoagulantes e corados por Giemsa (1). Os parâmetros analisados foram: hematimetria (HT), hematócrito (H), hemoglobinometria (HB), número de trombócitos (TR), leucometria global (LG), volume corpuscular médio (VCM), concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) e contagem diferencial de leucócitos. A contagem de células foi realizada manualmente, em câmara de Neubauer (2) (3).
Os parâmetros bioquímicos analisados foram ALT, AST, ureia (UR), creatinina (CR), proteínas totais (PTN), albumina (ALB), glicose (GLI) e colesterol (COL), todas dosadas em analisador bioquímico automático (4).
Foi realizada análise estatística, utilizando os testes Kruskal-Wallis (5%) e Mann-Whitney (2%).
RESULTADO
Experimento 1 - Diferenças estatísticas significativas nos parâmetros hematológicos, cujas maiores médias foram (Tabela 1):
• S x CT – HT, LG e CHCM em S; VCM em CT.
• C x CT – HT em C; TR em CT.
• S x C – HT, LG, CHCM e TR em S; H e VCM em C.
A contagem diferencial de leucócitos apresentou diferenças significativas (Tabela 2):
• S x CT – Lf(abs) em S.
• S x C – Lf(%) e Lf(abs) em S; Ne(%) em C.
Na bioquímica sérica, diferenças significativas e maiores médias (Tabela 3):
• S x CT – PTNS, GLI e COL em CT.
• S x C – GLI e COL em C.
Experimento 2 - Diferenças hematológicas, com maiores médias (Tabela 1):
• S x CT – LG em S.
• C x CT – HT em CT; VCM em C.
A contagem diferencial apresentou diferenças, com maiores médias (Tabela 2):
• S x CT – Lf(%) e Lf(abs) em S; Ne(%) em CT.
• S x C – Lf(%) e Lf(abs) em S; Ne(%) em C.
A bioquímica sérica apresentou diferenças, com maiores médias (Tabela 3):
• S x CT – UR e ALB em CT.
• C x CT – AST e CR em C.
• S x C – ALT em C.
Os peixes apresentam alterações hematológicas em reação a ocorrências variadas. No estresse crônico há neutrofilia e linfopenia com diminuição na LG, pois os linfócitos são os principais leucócitos dos peixes, vistos em maior número em relação aos neutrófilos, em condições fisiológicas. As catecolaminas causam tumefação dos eritrócitos (maior VCM e menor CHCM), e diminuição no número de trombócitos. Na bioquímica sérica, o estresse causa aumento da glicemia (5).
As diferenças entre experimentos podem ocorrer por diferentes densidades praticadas. A maior parte do experimento 1 foi realizada em densidade alta, enquanto o experimento 2 foi totalmente realizado em baixa densidade. Altas densidades acentuam o estresse populacional comum entre grupos de Tilápia nilótica, espécie territorial e não gregária. O maior estresse imposto aos grupos do experimento 1 é expresso nas alterações hematológicas observadas nos grupos CT e C. A ausência dos sinais hematológicos de estresse em S nesta situação indica que o medicamento manteve as constantes biológicas em condições adversas.
A bioquímica sérica indica diferenças no metabolismo hepático e na eliminação branquial e renal. No experimento 1, menores níveis de COL e PTN em Sulphur indica que estes animais apresentam maior metabolismo hepático. No experimento 2, ALT e AST nos grupos S e C indicam que ambos podem apresentar maior atividade hepática em relação a CT. UR, como parâmetro de eliminação branquial, indica que Sulphur apresenta melhor excreção, enquanto CR, parâmetro renal, pode indicar que a eliminação renal de Calcarea carbonica é mais lenta, ou há conversão mais eficiente da creatina em creatinina. Os menores níveis de ALB em S e C indica maior utilização desta (6).
Os efeitos vistos em Sulphur permitem concluir que a utilização deste medicamento teria efeito profilático em condições de cultivo, diante da manutenção das constantes orgânicas em condições de estresse populacional. Assim, pode constituir uma terapêutica viável em piscicultura.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
1 – Ranzani Paiva MJT, Pádua SB, Tavares-Dias M, Egami MI. Métodos para análise hematológica em peixes. Maringá: Editora da Universidade Estadual de Maringá; 2013. p 19-34.
2 – Almosny NRP, Santos LC. Laboratory suport in wild animals medicine. In: Fowler ME, Cubas ZS. Biology, Medicine and Surgery of South American Wild Animals. Ames: Iowa State University Press; 2001. p 500-5.
3 – Almosny NRP, Nascimento MD, Silva KP. Hemograma de aves: métodos. In: 6º Congresso Internacional de Medicina Veterinária em Língua Portuguesa; 1993 dez 6-10; Salvador. Anais. Lisboa: Comitê Permanente dos Congressos Internacionais de Medicina Veterinária em Língua Portuguesa, 1993.
4 – Stoskopf MK. Fish Medicine. Filadelfia: WB Saunders Company; 1993. p 113-31.
5 – Vijayan MM, Aluru N, Leatherland JF. Stress response and the role of cortisol. In: Leatherland, JF, Woo PTK. Fish Diseases and Disorders: Non Infectious Disorders. 2th ed. Oxford: CABI Publishing; 2010. p 182-95.
6 – Campbell TW. Hematologia de peixes. In: Thrall MA. Hematologia e Bioquímica Veterinária. São Paulo: Roca; 2007. p 265-76
Palavras-chave: Oreochromis niloticus, patologia clínica, homeopat